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sexta-feira, 29 de abril de 2011

Para ser feliz, não vá com tanta sede ao pote

Obsessão pela felicidade
A busca pela felicidade é algo saudável.
Mas alguns pesquisadores começam a alertar que, pouco a pouco, essa busca está se transformando em uma obsessão muito pouco saudável.
Na verdade, a busca pela felicidade já está sendo comparada a uma obsessão religiosa - aquela visão fundamentalista, presente em todas as religiões, em todos os tempos.
Felicidade agora
Depois de um milênio e meio da chamada "cultura ocidental", nem Católicos e nem Protestantes viam a felicidade como algo a ser alcançado. O objetivo sempre fora livrar-se do pecado original, ganhar a salvação e ser feliz só depois da morte.
Mas veio o Iluminismo e, com ele, a noção de que a felicidade era algo para o presente e para esta vida corporal. Não seria necessário esperar pela morte para obter a felicidade - sem contar o risco de não se conseguir alcançá-la.
Renúncia e desprendimento logo deram lugar a outras "virtudes", que deveriam permitir cada vez mais momentos de felicidade.
Mas o filósofo francês Pascal Bruckner aponta é que, embora esse seja um bom objetivo, as pessoas estão se tornando infelizes em nome de sua busca pela felicidade.
"A felicidade se tornou um bem a ser vendido. O capitalismo exige que nós compremos, e, se temos que comprar, temos que buscar nossa satisfação nas compras. É por isso que as maiores lojas e empresas colocam a palavra felicidade em suas campanhas de marketing: 'estamos trabalhando pela sua felicidade', e por aí afora," afirmou ele em um artigo publicado na revista New Scientist.
Felicidade volátil
Esta cultura do consumo vem misturando a felicidade com tudo, incluindo perfumes, cremes, xampus, mas também com a busca por saúde, que logo se transforma em uma busca sem fim pela longevidade e até por uma obsessão por uma inalcançável juventude eterna.
O problema é que a felicidade parece se esvair com o momento da compra. E a última crise financeira mostrou que a maioria das pessoas sequer consegue arcar com suas contas - débitos em parte assumidos em busca da felicidade.
"Mas você não pode comprar a felicidade ou construí-la como uma casa, ou pedi-la como faz com um prato em um restaurante. Ela é muito mais caprichosa e difícil," diz Bruckner.
Caminho para a felicidade
Para ele, o maior obstáculo à felicidade são as próprias pessoas, que precisam se reeducar para atingir seus ideais, vencendo os tabus criados pela sociedade consumista - cujo único compromisso é o próprio consumo.
"O fato de que a depressão seja uma das doenças mais prevalentes hoje deve-se provavelmente ao fato de que a felicidade tornou-se o único horizonte: a depressão emerge quando você não consegue ser feliz, é um colapso interno," afirma.
Como não alcançam a felicidade, em vez de parar e repensar seus objetivos ou suas táticas, as pessoas tentam procurá-la com um afinco cada vez maior, transformando a busca pela felicidade uma tarefa em tempo integral.
"As pessoas estão sempre se perguntando, 'Será que sou realmente feliz?', 'É isto que eu estava procurando?' Em vez disso, elas deveriam assumir uma visão mais relaxada: a felicidade vem e vai," propõe o escritor.
O que é felicidade
Para ele, felicidade é um momento de encantamento, quando as pessoas abandonam suas preocupações e sentem alcançar um estado mental diferente daquele do dia-a-dia.
"O que me faz feliz? Uma boa noite de sono, ter ideais, um bom projeto. Se você tem uma paixão, ela torna sua vida mais fácil, mesmo que você tenha dúvidas ou momentos de tristeza. Ter a felicidade como único objetivo torna as pessoas malucas, é muito difícil, e você não vai saber quando chegou lá porque não há uma definição precisa de felicidade," diz Bruckner.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Raízes africanas

Informações sobre as histórias de africanos transportados à força em navios negreiros – ou tumbeiros, como eram chamadas essas embarcações – pelo Atlântico estão reunidas em um novo site na internet.
Trata-se do projeto African Origins, que utiliza como base informações de 9.453 africanos libertados pelas Comissões Mistas (sistema de tribunais internacionais criado na época para julgar os navios acusados de envolvimento no tráfico de escravos) para fornecer dados sobre quase 70 mil pessoas durante a supressão do comércio transatlântico de escravos no século 19.
Pelo site é possível conferir o resultado de uma série de contribuições linguísticas e culturais do registro de um nome. Durante a busca, o usuário tem acesso a informações como o lugar de origem, o ano de partida e o nome do navio em que estava a pessoa desejada, além de traçar os padrões migratórios de africanos carregados do interior da África para portos no litoral do continente.
“Os registros disponíveis até o momento são de escravos libertados em Havana, na capital cubana. Cada registro é analisado detalhadamente antes de ser incluído”, disse Domingos Dellamonica Jr., programador no projeto que conta com o apoio do Fundo Nacional para as Humanidades, da Universidade Emory e do Instituto W.E.B. DuBois (Universidade Harvard), todos dos Estados Unidos.
Formado em Ciências da Computação pela Universidade de São Paulo, Dellamonica teve mestrado apoiado por Bolsa da FAPESP e concluído em 2007 na mesma universidade. Atualmente, cursa o doutorado na Emory.
African Origins: www.african-origins.org

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Seja mais sociável!

Segundo uma investigação realizada no Centro Médico Universidade Rush, EUA, para manter o cérebro saudável, é tão bom visitar amigos, ir a festas e até mesmo à igreja como fazer palavras cruzadas.

O estudo, que defende que a actividade social frequente pode ajudar a prevenir ou retardar o declínio cognitivo em idade avançada, acaba de ser publicado no jornal da Sociedade Internacional de Neuropsicologia, de acordo com o Eurekalert.

Na análise dos dados, os investigadores tiveram um cuidado especial para tentar afastar a possibilidade de que o declínio cognitivo precede, ou causa, isolamento social, e não o inverso.

“Quando as habilidades cognitivas de alguém quebram, é lógico pensar que essa pessoa está menos propensa a sair e encontrar os amigos, desfrutar de uma viagem de campismo ou participar em actividades de grupo. Se a capacidade de memória e de pensamento falha, a socialização torna-se difícil”, explica o investigador principal, Bryan James. “Mas as nossas descobertas sugerem que a inactividade social em si leva a alterações cognitivas”, sublinha.

Testes neuropsicológicos

O estudo incluiu 1138 idosos com idade média de 80 anos. Cada um dos participantes foi submetido a avaliações anuais que incluíam história clínica e testes neuropsicológicos.


A actividade social foi medida com base num questionário que perguntava quantas vezes, no ano anterior, os participantes tinham estado envolvidos em actividades de interacção social. Se, por exemplo, foram a restaurantes, eventos desportivos, jogado bingo, ou se fizeram passeios ou viagens nocturnos, trabalho voluntário, visitaram parentes ou amigos, assistiram a cultos religioso, etc.


A função cognitiva foi avaliada através de um conjunto de 19 testes para vários tipos de memória (memória episódica, semântica e de trabalho), bem como a velocidade e capacidade de percepção visuoespacial.


No início do inquérito, nenhum participante mostrava quaisquer sinais de comprometimento cognitivo. Em cinco anos, aqueles que eram mais socialmente activos mostraram taxas reduzidas de declínio cognitivo. Em média, aqueles que apresentaram os maiores níveis de actividade social apresentaram apenas um quarto da taxa de declínio cognitivo experimentados por menos indivíduos socialmente activos. Outras variáveis que poderiam ter sido responsáveis pelo aumento no declínio cognitivo, tais como idade, actividade física e saúde foram descartadas na análise.


Ainda não se sabe porque é que a actividade social desempenha um papel importante no desenvolvimento de problemas cognitivos. No entanto, o facto da
“actividade social desafiar adultos mais velhos a participar em complexas trocas interpessoais, o que pode promover ou manter a eficiência das redes neuronais”, explica Bryan James.

Para determinar se as intervenções destinadas a aumentar a actividade social em idosos têm um papel retardador ou de prevenção face ao declínio cognitivo,
“são necessárias mais investigações”, acrescentou o cientista.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

BORBOLETAS

Quando depositamos muita confiança ou expectativas em uma pessoa, o risco de
 se decepcionar é grande.

 As pessoas não estão neste mundo para satisfazer as nossas expectativas, assim como não estamos aqui, para satisfazer as delas.

 Temos que nos bastar... nos bastar sempre e quando procuramos estar com alguém, temos que nos conscientizar de que estamos juntos porque gostamos, porque queremos e nos sentimos bem, nunca por precisar de alguém.

 As pessoas não se precisam, elas se completam... não por serem metades, mas por serem inteiras, dispostas a dividir objetivos comuns, alegrias e vida.
  Com o tempo, você vai percebendo que para ser feliz com a outra pessoa, você precisa em primeiro lugar, não precisar dela. Percebe também que aquela pessoa que você ama (ou acha que ama) e que não quer nada com você, definitivamente, não é o homem ou a mulher de sua vida.

 Você aprende a gostar de você, a cuidar de você, e principalmente a gostar de quem gosta de você.

 O segredo é não cuidar das borboletas e sim cuidar do jardim para que elas venham até você.

 No final das contas, você vai achar
 não quem você estava procurando, mas quem estava procurando por você!

 Mário Quintana

A mente que se abre a uma nova idéia jamais voltará ao seu tamanho original.
  Albert Einstein

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Na minha próxima vida, quero viver de trás para frente

Começar morto, para despachar logo o assunto.
Depois, acordar num lar de idosos e ir-me sentindo melhor a cada dia que passa.
Ser expulso porque estou demasiado saudável, ir receber a reforma e começar a trabalhar, recebendo logo um relógio de ouro no primeiro dia.
Trabalhar 40 anos, cada vez mais desenvolto e saudável, até ser jovem o suficiente para entrar na faculdade, embebedar-me diariamente e ser bastante promíscuo.
E depois, estar pronto para o secundário e para o primário, antes de me tornar criança e só brincar, sem responsabilidades. Aí torno-me um bébé inocente até nascer.
Por fim, passo nove meses flutuando num "spa" de luxo, com aquecimento central, serviço de quarto à disposição e com um espaço maior por cada dia que passa, e depois - "Voilà!" - desapareço num orgasmo.

Woody Allen

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Bandeirantes da língua portuguesa

O Projeto de história do português paulista (Projeto Caipira), coordenado pelo professor Ataliba Teixeira de Castilho, mobiliza pesquisadores de diversas instituições com o objetivo de resgatar a história da língua trazida pelos portugueses que desembarcaram na Baía de São Vicente, em 1532.
Do litoral paulista, a língua se espalhou pelo país por diversas vertentes. O Temático, que reúne mais de 200 pesquisadores – 60 deles em São Paulo –, estuda, em uma espécie de “bandeirantismo”, os caminhos percorridos pelos falantes da língua portuguesa e sua transformação até chegar à língua falada hoje.
A 12ª edição do Seminário do Projeto de História do Português Paulista termina nesta sexta-feira (15/4) no Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP). O encontro procura avaliar os resultados obtidos pelo projeto apoiado pela FAPESP na modalidade Auxílio à Pesquisa – Projeto Temático, concluído no fim de 2010.
Castilho foi professor titular da USP, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Atualmente, aos 74 anos, é professor colaborador voluntário na Unicamp.
O pesquisador presidiu a Área de Letras e Linguística da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) (1987-1990), a Associação Brasileira de Linguística (1983-1985) e a Associação de Linguística e Filologia da América Latina (1999-2005).
Entre seus livros recentes estão Nova Gramática do Português Brasileiro (Contexto, 2010), Gramática do Português Culto Falado no Brasil (Editora da Unicamp, 2008), Descrição, História e Aquisição do Português Brasileiro (Pontes, 2007), Gramática do Português Culto Falado no Brasil (Editora da Unicamp, 2006).
 
Agência FAPESP – Professor Castilho, como surgiu o Projeto Caipira?
Ataliba Teixeira de Castilho – O projeto de pesquisa teve origem em 1998, durante o primeiro seminário que fizemos sobre o tema. Participaram professores brasileiros especializados em linguística histórica. Pensei em convidá-los para o projeto de modo que eles pudessem transformar aquele projeto estadual em nacional. E deu certo.
Agência FAPESP – E por que fazer esse projeto em São Paulo?
Castilho – Porque a língua portuguesa começou a ser implantada em 1532, em São Vicente, aqui no Estado de São Paulo. Foi o primeiro povoamento, quando os portugueses decidiram explorar de fato o território. Isso não ocorreu quando Pedro Álvares Cabral chegou à Bahia e partiu em seguida para as Índias. Durante 32 anos o território descoberto não foi colonizado ou ocupado. Foi em 1532, em São Vicente, que o Brasil realmente começou.
Agência FAPESP – Então, foi a partir do Estado de São Paulo que ocorreu a penetração da língua portuguesa pelo país?
Castilho – Sim, foi onde tudo começou. Depois de São Vicente vieram Santo André, São Paulo e Santana do Parnaíba. Foi por essas quatro cidades que começou a penetração do português no Brasil – com exceção do então Norte (Grão Pará e Estado do Maranhão), que era praticamente outro país e onde a colonização começou entre os séculos 17 e 18. Devido à proximidade do rio Tietê, o movimento do bandeirismo partiu de Santana do Parnaíba e começou a expansão da língua para o Mato Grosso. De Santana do Parnaíba, os bandeirantes também foram até o Peru, atrás das minas de prata, percorrendo um caminho construído pelos índios Peabirus. Como lá a colonização foi espanhola, o português não se implantou. De São Miguel Paulista, os bandeirantes levaram o português para Minas Gerais, subindo por Itaquaquecetuba e Taubaté, atrás do ouro.
Agência FAPESP – A partir do Estado de São Paulo ocorreu a penetração da língua portuguesa pelo país por esses caminhos?
Castilho – Sim, mas no fim do século 18 surgiu um terceiro caminho: o dos comerciantes que andavam com mulas. Esses tropeiros levaram o português até o Uruguai, que no tempo do império era uma província brasileira, a Cisplatina. Chegaram à Colônia do Sacramento, cidade uruguaia criada por tropeiros de Sorocaba. Tudo isso foi movimento dos paulistas. Quando São Paulo se desenvolveu mais do que todas as outras, tornou-se a maior capitania do Brasil, que inclui o que hoje são estados independentes. O termo capitania foi substituído por província e depois por estado. Então, pode-se ver que ao estudar que língua portuguesa chegou aqui e como ela se desenvolveu e mudou, conhecemos a própria história do português brasileiro.
Agência FAPESP – Uma dimensão que está espelhada no número de pesquisadores reunidos pelo projeto coordenado pelo senhor.
Castilho – Tem que ser assim, é preciso reunir muitos especialistas. Só no Estado de São Paulo somos em 60 pesquisadores, das três universidades públicas e também da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Esse grupo maior também fez uma espécie de bandeirismo (risos). Hoje, o Projeto de História do Português Brasileiro (PHPB) tem cerca de 200 pesquisadores integrados em 11 equipes regionais, cada uma trabalhando com questões locais.
Agência FAPESP – Em todo o Brasil?
Castilho – Não, pois ainda não temos ninguém no Norte. Mas queremos ter colaboradores nessa região.
Agência FAPESP – Poderia dar alguns exemplos de contribuições do projeto para o conhecimento da história do português brasileiro?
Castilho – Esse projeto trata do conhecimento de como o português se implantou e de como ele mudou. A grande pergunta, como diz um colega nosso, é: “Que língua foi aquela que saiu das caravelas?”. Sabemos hoje que foi o português médio, um momento da história do português europeu. E aqueles navegadores que saíram das caravelas quando crianças aprenderam a falar essa modalidade, o português arcaico médio, que vai de 1450 até 1530. Essa é justamente a base do nosso português. Temos um grupo em nosso projeto que estuda como foi esse português médio para poder descrevê-lo. Nesse grupo está minha mulher, Célia Maria Moraes de Castilho, que também é linguista e leu o que se publicou dos inventários e testamentos, do século 16 até 1920, que estão guardados no Arquivo Público do Estado de São Paulo. Para entender como se deu o espalhamento desse português a partir de São Paulo, outro grupo, coordenado pelo professor Manoel Morivaldo Santiago Almeida, da USP, estudou como foi o deslocamento da língua pelo Tietê, levado pelos bandeirantes. Esse grupo verificou, por exemplo, que no Mato Grosso se guarda até hoje pronúncias do português médio arcaico. Em vez de dizer chão, eles dizem “tchon”. Palavras com “ch” são ditas com “tch”, e “x” é dito “xê”. Então temos “tchapéu” ou “tchuva”. Eles não têm o ditongo nasal “ão”, e sim a vogal nasal “on”, como era no português antigo. Estou falando de fonética, mas há também outras características gramaticais que se conservaram lá.
Agência FAPESP – E isso até na capital, Cuiabá?
Castilho – Sim. E é no meio familiar que você surpreende isso, essas pronúncias todas do português de antes.
Agência FAPESP – Como se desenvolveram aqui em São Paulo o português popular e o português culto?
Castilho – A professora Ângela Cecília Souza Rodrigues, da USP, é a responsável pelo projeto sobre o português não padrão, que é o dos analfabetos e de pessoas que aprendem em casa. O objetivo é documentar e achar nos documentos traços desse português popular.
Agência FAPESP – Ela já obteve resultados?
Castilho – Ela começou de trás para frente, descreveu primeiro o que tem hoje no português popular. Não é só paulista que fala o português popular, pois o estado atraiu gente de todos os lados. A professora Ângela encontrou nos primeiros documentos de traços linguísticos a questão da concordância. Ela observou que muito da concordância que hoje se considera padrão popular era usada pelos portugueses naquele tempo, como em “os menino chegou”, por exemplo. Isso não foi uma criação daqui não, estava lá. Outro grupo de pesquisa estuda a formação do padrão culto, a história do português ensinado nas escolas. As professoras Marilza de Oliveira (USP) e Maria Célia Lima-Hernandes (USP) estudam esse ponto, de como se formou o português culto em São Paulo.
Agência FAPESP – O que elas descobriram?
Castilho – O que se descobriu é que até algum tempo atrás o português culto era idêntico ao português europeu, mesmo aqui em São Paulo. Só se começou a falar o português culto bem tardiamente. No começo era um povão, indistinto, que falava o português popular. Foi preciso surgir escolas para que aparecesse essa outra variedade. Aqui em São Paulo foi muito importante a fundação da Faculdade de Direito, em 1827, que trouxe gente do Brasil inteiro. Na mesma época, começou a haver um interesse maior em ler jornais, escrever e ler poesias, romances. Era o Romantismo. Pois esse grupo de pesquisa analisa esses documentos e observa que reação as pessoas que vinham para cá tinham em relação à língua falada aqui, que era o caipira.
Agência FAPESP – E como se desenvolveu o português culto?
Castilho – Do início do século 19 até a instituição da USP, em 1934, foram criadas várias escolas isoladas, pois não havia a concepção de universidade como existe hoje. No século 19, o português culto era imitação exata do português culto europeu. Em 1922, com o movimento modernista e o crescimento da comunidade de São Paulo, não se considerava mais que o português culto era o português dos portugueses, nós nos descolamos disso. Ainda em 1920, 1930, tínhamos certa sensação de nação colonizada. Quando isso passou é que nos desgarramos do português escrito culto europeu. E aí os modernistas tiveram um papel muito importante, sobretudo Mário de Andrade. Ele criou biblioteca, departamento de cultura, fundou a revista do Arquivo Municipal. Houve uma grande agitação cultural e as pessoas foram assumindo com mais naturalidade a forma como elas escreviam.
Agência FAPESP – Hoje, a característica caipira é muitas vezes encarada de forma depreciativa. Naquela época ocorria a mesma coisa?
Castilho – Caipira não era uma palavra depreciativa, era a designação do português falado pelos paulistas. Depois, com o desenvolvimento da cidade de São Paulo como centro cultural, aí sim ficou muito assemelhado ao português popular, de pessoas sem escolaridade. E como a cidade cresceu demais, esse português foi empurrado para o interior do estado e ali ficou.
Agência FAPESP – Em uma entrevista, o senhor fala sobre o uso da internet pelas crianças e diz que elas passaram a escrever mais, o que seria positivo. Mas, ao mesmo tempo, a rede não incentiva a grafia errada?
Castilho – Sim, as crianças passaram a escrever mais e, sobretudo, não por que o professor manda. Para nós, linguistas, essa questão do escrever errado ocorre quando uma pessoa escreve e a outra não consegue entender. No mais, é uma variedade que você está jogando. O que é escrever errado? É o português não culto? A internet não atrapalha, ela ajuda e resolve um problema de ortografia, no caso de uso de abreviações, como é tudo abreviado. A ortografia é convenção, ela vai atrás da língua com o seu dinamismo. Eu vejo muito o lado positivo. Como linguistas nos perguntamos o tempo todo como é que a mente humana conseguiu criar essa variedade louca de expressões, essa enorme complexidade. Essa é a nossa grande questão.

O corpo fala

A manipulação de corpos em rituais funerários, utilizando ossos como símbolos para expressar crenças sobre a morte, não se restringia apenas aos povos que habitavam a região dos Andes há 10 mil anos, durante o Holoceno inicial. A prática também era realizada nesse mesmo período por povos localizados nas chamadas “terras baixas” do continente, incluindo o Brasil, revelam pesquisas realizadas pelo arqueólogo André Menezes Strauss, que cursa doutorado no Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva, em Leipzig, na Alemanha.
As descobertas dos estudos foram apresentadas em congresso da Associação Norte-Americana de Antropologia Física, realizado de 12 a 16 de abril em Minneapolis, nos Estados Unidos.
Durante sua pesquisa de mestrado, realizado no Instituto de Biociências (IB) da Universidade de São Paulo (USP), com Bolsa da FAPESP, Strauss participou da exumação de 26 esqueletos humanos sepultados no sítio arqueológico Lapa do Santo, em Minas Gerais, que foi escavado nos últimos dez anos no âmbito do Projeto Temático "Origens e microevolução do homem na América: uma abordagem paleoantropológica", financiado pela FAPESP, e  coordenado pelo professor do IB, Walter Neves.
Ao analisar os esqueletos humanos, datados de 8.500 anos, Strauss percebeu que os ossos apresentavam marcas de corte por instrumentos de pedra, tinham sido expostos ao fogo ou receberam aplicação de ocre (tinta marrom). Além disso, alguns esqueletos tinham membros amputados e foram sepultados de forma desarticulada, juntando os ossos de vários indivíduos, por exemplo.
Intrigado com a descoberta, Strauss e Pedro José Tótora da Glória, doutorando em antropologia física na The Ohio State University, revisitaram as coleções de ossos que foram escavados desde o início do século 19 em outros sítios arqueológicos na região de Lagoa Santa, onde está situada a gruta de Lapa do Santo. Os pesquisadores constataram que os ossos compartilhavam as mesmas características dos encontrados em Lapa do Santo.
“Identificamos um certo grau de sofisticação nos ritos mortuários desses grupos, que eram bastante diversificados, tinham características muito peculiares e uma forte ênfase na manipulação do corpo”, disse Strauss à Agência FAPESP.
Além de ter os ossos cortados e marcados, os esqueletos também foram organizados e dispostos nas sepulturas de acordo com regras muito específicas. O crânio de um adulto, por exemplo, era enterrado com o restante do esqueleto de uma criança, enquanto crânios infantis eram sepultados com os ossos de pessoas maduras.
Em outros casos, os dentes de um indivíduo eram removidos para adornar os restos mortais de outro. “Eles expressavam através da materialidade do osso princípios dicotômicos que deviam fazer parte da cosmologia deles”, analisou Strauss.
De acordo com o pesquisador, não se esperava que as práticas mortuárias dos primeiros habitantes da América do Sul fossem tão elaboradas, como revelaram as pesquisas.
Isso porque na antropologia havia uma ideia de que, pelo caráter nômade dos caçadores-coletores pré-históricos, eles não despenderiam tempo e energia para enterrar mortos. Mas a descoberta das múmias Chinchorros no Chile, no início da década de 1970 e, agora, dos achados em Lapa do Santo estão colaborando para demover essa ideia.
“Assim como os grupos em Lagoa do Santo, os Chinchorros também eram caçadores-coletores. Ninguém esperava que grupos vivendo há mais de 8 mil anos na costa andina mumificassem seus mortos e que os grupos em Lagoa Santa teriam rituais funerários elaborados”, disse Strauss.
Com base nessas descobertas, segundo o cientista, será possível estabelecer um novo quadro regional para as práticas mortuárias na América do Sul durante o Holoceno inicial, caracterizado não pela simplicidade dos enterros, como se imaginava, mas pela sofisticação dos ritos funerários, como foi comprovado pela manipulação do corpo pelos grupos que habitaram Lagoa do Santo.
“Agora não dá mais para dizer que durante o Holoceno inicial as práticas de manipulação do corpo estavam limitadas aos Andes, mas sim que estavam dispersas por boa parte da América do Sul, incluindo as terras baixas”, afirmou.
Peter Lund
No Instituto Max Planck, Strauss estuda evolução humana e, paralelamente à sua pesquisa de doutorado, continua investigando as práticas mortuárias sul-americanas.
Na Europa, o cientista pretende visitar as coleções escavadas pelo naturalista dinamarquês Peter Lund (1801-1880) em Lagoa Santa para tentar encontrar evidências de que elas apresentam as mesmas características dos ossos escavados recentemente no sítio arqueológico mineiro e que passaram despercebidos pelos arqueólogos que já haviam passado por Lapa do Santo. As coleções de Lund estão no Museu de História Natural da Dinamarca.
“Demos muita sorte porque a região de Lagoa Santa tem centenas de cavernas que foram escavadas por equipes de arqueólogos. Lapa do Santo era um sítio arqueológico virgem”, disse Strauss.
Os arqueólogos que escavaram a região mineira anteriormente podem não ter atentado ao fato de que os ossos apresentavam marcas por terem outros objetivos de pesquisa, como a coexistência do homem com a megafauna e morfologia craniana. Além disso, não era possível identificar essas características nos esqueletos com os métodos disponíveis na época.
“Levamos mais de duas semanas para exumar cada sepultamento humano e escavamos apenas cerca de 15% do sítio de Lapa do Santo. A ideia é deixar material disponível para ser escavado no futuro, com novas técnicas”, disse Strauss.
Mais informções sobre a pesquisa, clique aqui.

Por Elton Alisson