0
   
       1. O Problema. Falar em produção de produtores  significa, para mim, falar nos meios, ritualizados ou não, através dos  quais tem lugar a produção de seres humanos que trabalham a terra. A  produção de produtores é uma parte de um processo muito mais vasto de  reprodução social. Torna-se necessário, por isso, esclarecer, antes de  mais, o que entendo por reprodução social e o que esta é enquanto  processo.
          Ao examinar, em 1958, o ciclo de  desenvolvimento dos grupos domésticos, Meyer Fortes definiu o conceito  como um processo que inclui todos os mecanismos institucionais, normas e  actividades consuetudinárias, que servem para manter, renovar e  transmitir, o capital social entre as gerações. Goody (1958) que, como  Fortes (1958), também escreveu sobre o tema, centra o estudo da  reprodução na análise das regras de herança e de sucessão através das  quais são distribuídos os direitos de propriedade entre gerações  sucessivas. O mesmo autor veio, mais tarde, a refinar as suas hipóteses,  incidindo a sua reflexão sobre as modalidades de herança e os seus  efeitos nas relações interpessoais e principalmente no casamento, visto  como uma forma de controlo de propriedade de uma importância vital tanto  para a produção como para a reprodução (1976) , o qual tem vindo a ser  controlado, enquanto instituição, pela Igreja e pelo Estado, nas  sociedades ocidentais (1983). Bourdieu (1976) procede à distinção entre  reprodução biológica, cultural e social, assinalando que é por meio  destes três sistemas que todos os grupos procuram transmitir, à geração  que se lhes segue, através do matrimónio, a totalidade de poder e de  prestígio que herdaram. Meillassoux (1973) defende que, nas sociedades  agrárias, o campo da análise da reprodução social é aquele que diz  respeito ao controlo sobre a força do trabalho, ou seja, sobre pessoas. O  controlo exercido sobre as mulheres por meio do casamento é, na sua  perspectiva, um elemento fulcral neste processo. Godelier (1975, 1979,  1981) afirma, por sua vez, que as estruturas produtivas e reprodutivas  se encontram no campo do parentesco, enquanto expressão demográfica da  sociedade e no campo do ritual, visto como o conjunto de ideias que  operam na produção de relações sociais.
          Quer se trate das definições  explícitas de Fortes ou de Bourdieu ou dos elementos analíticos  fornecidos por outros, o campo de estudo da reprodução social parece  conter elementos que, como Harris e Young (1981) sublinharam,  ultrapassaram o campo restrito da aldeia, da produção e da tecnologia.  Enquanto processo, a reprodução social tem como resultado a prática  social de um sistema gerador dos seus próprios elementos da continuidade  (Iturra, 1982). Refira-se que todas estas observações fazem uma  referência, implícita ou explícita, a sociedades não industriais  contemporâneas estudadas por antropólogos sociais. Note-se, também, que a  ênfase, na análise deste fenómeno, se tem centrado em relações como o  casamento, o trabalho, a propriedade e o conhecimento. No que diz  respeito a este último, o seu estudo é feito nas rubricas do costume ou  da cultura ou ainda na do ritual. A reprodução social como processo  parece assim consistir no modo como se organizam elementos constituintes  estruturais, o casamento, a terra, o trabalho e o conhecimento, que  asseguram a continuidade da sociedade, com ou sem mudança.
          A meu ver, o estudo da  reprodução social também requer que sejam tomados em consideração os  factos da história económica e do pensamento religioso, na medida em que  a variação nos termos materiais e nas ideias tem como resultado uma  produção diferente de relações sociais. Se sublinho aqui a importância  de que se revestem as ideias religiosas, tal deve-se ao facto de ser  fundamentalmente na religião que encontramos, abstraída, sistematizada e  exprimida pelas pessoas, nas áreas camponesas, a racionalidade das  relações sociais. O processo de produção de produtores, tal como se  desenrola num grupo camponês, fornece-nos os elementos, que nos permitem  compreender o modo pelo qual os seres humanos são ensinados e treinados  através de um ciclo ritual, que se encontra contido em ideias  religiosas Mostra-nos, também, que o casamento, sendo uma relação social  proclamada, assinalada e aceite como o ritual oficial que começa a  produção social, bem como a biológica de seres humanos, mais não é do  que uma das muitas formas criadas pelas pessoas no âmbito das suas  práticas reprodutivas. Este é o seu lugar social, apesar do carácter  sagrado que lhe é conferido pelas ideias religiosas formais, pelo ritual  oficial e pelas próprias pessoas, carácter esse que se encontra  reflectido na própria análise antropológica, obscurecendo a dimensão  cultural do casamento e o valor de outras práticas. Como disse  anteriormente,  muitos autores colocando de parte as razões culturais  que os criam, fazem do ritual e do conhecimento o centro das suas  análises da reprodução social e do casamento a relação social estabelecida da qual todas as outras derivam.
 Desde que consideremos que as ideias  religiosas representam o principal conjunto de ideias da racionalidade  camponesa que opera na produção e reprodução social; e desde que o  ritual seja pensado como uma via de publicitar relações sociais e de  comunicar ideias com vista à produção de produtores, então podemos ver o  casamento através de uma outra perspectiva problemática, observando-o  como mais um ritual criador de relações sociais e como mais uma relação  entre várias outras, tudo isto constituindo fenómenos que necessitam de  explicação.
          É exactamente neste aspecto que  desejo agora centrar a minha análise, na medida em que quero tratar, de  entre todos os factos que podem ser tidos em conta no estudo da  reprodução social, aqueles que se encontram relacionados com a produção  social de seres humanos, observa-da já, através da análise do casamento.  A minha hipótese exploratória assenta na consideração de que existe uma  contradição entre a ideia de que a reprodução deve ter lugar no  interior do casamento e as condições que rodeiam a afectividade deste. A  terra, o trabalho e a tecnologia têm sido até hoje os principais  recursos envolvidos na reprodução camponesa e, por isso, quer se  tratasse de um momento histórico em que a terra se encontrava  concentrada e o trabalho disperso, quer de um outro em que o contrário  sucedia, com a terra dispersa e o trabalho concentrado, a sua aquisição,  conjugação ou acumulação, têm constituído o objecto da manipulação de  relações sociais por parte dos produtos. Tal como a terra é manipulada  no sentido da concentração ou no da divisão e a na tecnologia no da  continuidade ou nos da invenção ou substituição, assim também os seres  humanos, através da manipulação das relações sociais, são dirigidos para  várias funções que permitem manter viáveis os recursos disponíveis. Se  não existisse manipulação dos diversos laços sociais – pelas próprias  pessoas ou por vontade externa –, poderia em algum momento suceder, que  houvesse indivíduos em excesso num determinado território ou que  existissem demasiados direitos do mesmo tipo sobre a mesma coisa.
          Esta manipulação tem lugar entre  dois extremos: o de juntar aqueles que, pela natureza da sua relação  com as coisas, permitirão a concentração de recursos e o de levar à  dispersão dos restantes, habitualmente a maioria. Aqueles que ficam têm  de procurar organizar um grupo produtivo adequado, o que é feito, nas  áreas camponesas dos nossos dias, por meio da procriação e da activação  dos laços de parentesco e através de uma série de contratos diferentes,  que definem uma relação entre camponeses e senhores, em tempos mais  recuados. Estes eram os tempos em que a terra estava concentrada nas  mãos de uns poucos, o que dificultava as condições de casamento, sem pôr  em causa a produção de produtores. Quando a
 propriedade camponesa começa a aparecer, o  casamento ganha uma maior importância, mas a produção de produtores  torna-se para eles próprios problemática, devido ao seu número e ao  conjunto de direitos de que são portadores. Entre estas duas situações  históricas bem diversas, têm lugar um certo número de estratégias  camponesas, cuja variação parece estar ligada  à superioridade que vai  tendo a produção destinada ao mercado sobre a produção de bens de uso e à  mudança correlativa nas condições de troca, que ocorre com a passagem  da organização do trabalho camponês pelos senhores à sua subordinação ao  capital mundial (Iturra, 1978, 1981). Existe todo um conjunto de  alternativas geradas pelos produtores, sendo possível entrever, pelo  menos, quatro formas, por via das quais a reprodução social se efectiva:  por meio de um sistema de reprodução em que o casamento é combinado com  o celibato e a ilegitimidade, como observou O’Neill (1984) para o  Nordeste de Portugal, pela combinação do casamento com o não casamento,  como pude detectar na minha investigação em Portugal; pela manipulação  dos laços de parentesco, visando a construção de uma força de trabalho  através da troca de herdeiros, da exclusão de filhos da casa dos pais e  de  tornar a classificar dos parentes, bem como por intermédio das  trocas de trabalho, como demonstrei no caso da Galiza (1978, 1980,  1981); e, também, mediante a integração diferencial dos membros do grupo  doméstico no seu seio, entre os que partem e os que ficam, como Bouquet  (1984) refere para o Centro de Portugal. Estas observações espelham o  casamento – quer enquanto ritual, quer como relação social – como um  campo onde se desenvolvem as estratégias que visam a obtenção de  recursos humanos ou materiais, em qualquer grupo doméstico, afirmação,  cuja pertinência pude verificar entre os camponeses do vale central, no  Chile, da Galiza e do Centro de Portugal. Pessoalmente, gostaria de  discutir todos estes tópicos em função das duas asserções  inter-relacionadas: as primeiras têm a ver com a investigação sobre o  lugar que o casamento ocupa na sua relação com outras práticas  reprodutivas e rituais; as outras duas estão relacionadas com a função  que se atribui ao casamento, a de este servir para angariar recursos.
          Distinguindo, as duas primeiras  podem-se definir assim: o casamento é apenas uma de entre as várias  formas de um sistema de práticas reprodutivas; o casamento é um rito de  um ciclo de rituais, cuja finalidade comum é a produção de produtores.  As outras duas são: o casamento é a fase final de um processo de  escolha, pelo qual são adquiridos e conjugados recursos e materiais; o  casamento é uma instituição redistributiva regulada pelo lucro.
 2. O contexto
         Pinheiros é uma das catorze  aldeias de uma freguesia rural das terras do Centro de Portugal. Os  efectivos da população são estimados em 175 indivíduos residentes,  distribuídos por 64 das 68 casas da aldeia. Dez de entre estas 64 casas  nem sempre estão ocupadas, quer porque o grupo doméstico não se encontra  na localidade, quer porque habita noutra casa. A maioria das habitações  pertence aos proprietários das pequenas explorações de terra, que se  encontram dispersas na área da aldeia. Vinte e nove das explorações têm  menos de 1 ha, doze têm de área 1 ha e 5 ha e três de 5 ha  e 10 ha. Dez  dos grupos domésticos não possuem terra, trabalhando fora dois e  arrendando terras oito. Refiro aqui a dimensão das parcelas porque,  embora esta não seja importante do ponto de vista da produção, é   contudo, no que diz respeito às estratégias de reprodução. Um certo  número de casas (dezassete) arrenda terra, em suplemento à sua  propriedade. As parcelas são trabalhadas através do recurso à força  humana e animal, sendo utilizada tecnologia que, no fundamental, é de  invenção camponesa, ou seja, o arado, a grade e a enxada. Na aldeia há  três tractores, utilizados pelos donos e por vezes alugados a outros ou  emprestados em troca de trabalhos. Os principais produtos são uvas,  azeitonas, batatas e cereais – uma parte da terra da aldeia é ocupada  por pinhais. As uvas são vendidas à cooperativa vinícola sediada na vila  próxima, embora alguns façam vinho no seu lugar. O vinho, o azeite (que  é também fabricado na aldeia), as batatas e os cereais destinam-se, em  parte, ao uso da casa, dependendo a quantidade que é colocada no mercado  do resultado das colheitas e dos recursos dos produtores. Os pinheiros  são arrendados ordinariamente a uma companhia que recolhe a resina. Cada  parcela compõe-se de dois tipos de terra: sequeiro, terra seca e lameiro, terrenos irrigados.
          Pinheiros está situada numa  encosta do vale do Mondego e as suas terras encontram-se distribuídas  entre um pequeno vale lateral e suas vertentes. O gado existente  compõe-se de ovelhas, porcos e burros, havendo ainda dois aviários. Os  camponeses, na sua maioria, são membros de uma cooperativa da vila  próxima, que lhes adianta créditos solvidos na época das colheitas. A  esta mesma cooperativa são habitualmente vendidos as batatas e os  cereais. Estas vendas, a que se juntam as do vinho e do azeite, fornecem  pouco dinheiro e por isso, a maioria das casas recorre a outras  actividades, como a emigração, o trabalho assalariado em indústrias  locais, ou o trabalho como jornaleiro ou resineiro. Há também, muitas  casas que recebem dinheiro através de pensões por motivos de doença ou  de idade. Como se pode verificar, temos aqui o quadro de uma aldeia  camponesa europeia, que se sustenta a si própria por meio do consumo  directo dos seus produtos e através da emigração ou de outras formas de  trabalho assalariado, onde quer que este se encontre.
          Até aos começos do século XIX a  terra pertencia à Igreja e ao senhor local – o morgado – e era cultivada  por caseiros – os quinteiros –, que pagavam uma renda em géneros. A  propriedade camponesa começa a aparecer em meados de oitocentos e por  volta de 1910, a maioria da terra da aldeia, que outrora pertencera ao  fidalgo local, encontrava-se nas mãos dos produtores. Isto significa em  termos globais, que, entre o século XIX e a actualidade, a terra passa  do sistema de quintas – existiam sete na localidade –,  propriedade do morgado, ao sistema da propriedade privada camponesa. A  terra, no entanto, permanece uma mercadoria rara, em relação com as  necessidades de consumo e venda. Embora tenham existido medidas  políticas, que permitiram a aquisição de propriedade fundiária pelos  camponeses. À extinção dos morgadios, nenhuma foi, contudo, tomada no  sentido de lhes possibilitar o controlo do processo de circulação de  mercadorias. É neste contexto que se torna compreensível a necessidade,  que os camponeses sentem de controlar o sistema de produção e circulação  das pessoas, é que estas são a parte dos recursos aplicados ao trabalho  de terras por eles produzidas. E, também, porque uma vez produzidas, as  pessoas são portadoras de direitos sobre os recursos, num sistema onde  estes se encontram desigualmente repartidos. Tudo isto é feito através  da combinação do casamento e da sua ausência num sistema reprodutivo.
 3. O casamento, uma das formas de um sistema de práticas sociais reprodutivas.
         Pretendo aqui assinalar que  existem outras formas de reprodução humana, além do casamento, que  embora não sejam instituídas formalmente, são socialmente reconhecidas,  bem como existem práticas sociais que redefinem os laços de parentesco,  os quais são o resultado, quer do casamento, quer de outras formas de  acasalamento. A combinação do acasalamento no matrimónio, do  acasalamento por meio de práticas socialmente aceites, embora não  instituídas formalmente, e a redefinição posterior dos laços sociais,  tudo isto constitui um sistema de vias alternativas para a reprodução  humana, cujo peso varia ao longo da História, de formas menos centradas e  outras mais centradas no casamento.
          O casamento aparece, hoje em  dia, numa primeira aproximação, como a instituição abrangente que, aos  olhos das próprias pessoas, funda o grupo doméstico. Para as pessoas de  Pinheiros, abandonar o lar familiar e a aldeia, tornou-se sinónimo de  casar, quer tal suceda ou não no plano dos factos. É por isso que, mesmo  na actualidade, quando parece haver maiores possibilidades económicas  para a mobilidade individual, quer na vila próxima, quer algures na  emigração, ainda assim o casamento inicia a saída da casa e da aldeia.  Tal pode observar-se no comportamento dos jovens, com as raparigas  frequentemente em estado de gravidez pré-nupcial, casando muito jovens,  entre os 15 e os 18 anos, com rapazes de idades compreendidas entre os  19 e os 20 anos. Afigura-se que, numa aldeia como Pinheiros, em que há  controlo crescente sobre a terra por parte dos camponeses, a forma  oficial do acasalamento predomina sobre todas as outras. A composição  dos grupos domésticos em Pinheiros era a seguinte, em 1983: 32 eram  compostos por pai e filhos, 7 por avós, pais e filhos, 12 por casais sem  filhos, 3 por grupos de irmãos solteiros e 6 por pessoas que habitavam  sós. Dos grupos domésticos estudados em 1983, 56 são casais, um é  composto por uma mãe solteira, em três deles os seus membros nunca  casaram ou tiveram filhos e em dois grupos domésticos de solitários o  homem de um mantinha relações com a mulher de outro, sem se encontrarem  casados. Parece, à primeira vista, que nos nossos dias, em Pinheiros,  toda a gente compreende, que o comportamento tem de se submeter, de um  modo claro, à única categoria do casamento. A observação de campo e o  estudo de histórias de família mostram, no entanto, que há um certo  número de casos que divergem do modelo verbalizado e o do registado nos  arquivos, cujo tratamento diz mais respeito a uma análise qualitativa,  do que a uma de tipo estatístico. Em alguns dos grupos domésticos os  pais são os descendentes de pais solteiros, desconhecidos, ou então  filhos de pais incógnitos. Noutros, sucede que nem todas as crianças são  filhos do marido e da mulher, mas filhos da mulher e de um outro homem e  mais raramente, filhos do homem e de uma outra mulher. E, finalmente,  há ainda os casos em que uma rapariga tem filhos do pai ou de um irmão.  Temos assim, aquilo a que chamo reorganização social da paternidade, que  tem lugar depois de alguém ter um ou mais filhos. Os que não tiveram  filhos ou filhas adoptaram, de uma maneira ou de outra, uma sobrinha, um  sobrinho ou um afilhado, que são para todos os efeitos práticos, como  se fossem seus filhos. Estes descendentes sociais cumprem os seus  deveres para com os pais sociais, como se estes fossem os seus pais  biológicos, que são os seus «verdadeiros» pais, de acordo com a noção  ocidental de paternidade, em oposição a qualquer outro arranjo que fica  sob a denominação de paternidade «fictícia». Quero aqui deixar vincado  que, embora esta noção exista em Pinheiros (tal como na Galiza, onde  observei o fenómeno pela primeira vez), a paternidade socialmente  definida torna-se tão forte que obscurece os laços biológicos até ao  ponto dos pais biológicos desistirem do seu papel enquanto pais e a  criança ser reconhecida como um rebento dos seus pais sociais. Então, as  novidades de real  e de fictício desapareceram enquanto categorias opostas e desenvolvem-se laços de parentesco efectivo. 2  Esta redefinição da paternidade implica a ligação do rebento social com  os recursos e deste modo, ele vem a ser o herdeiro da casa. Esta é a  razão pela qual tudo isto se processa dentro de laços estreitos de  parentesco legalmente definidos e apenas a falta de parentes legais  permite a qualquer um dotar o seu filho social. No interior desta mesma  forma de  reprodução  social,  através da qual  nasce um  grupo    doméstico,npodemos encontrar casos em que casais sem filhos adoptam os  filhos  de criados seus ou em que netos coabitam com avós em benefício  mútuo, já que os primeiros ajudam os segundos na sua velhice, em troca  de dádivas em terra ou em alfaias. Há pois, uma rede de paternidade  social, que não corresponde ao modelo biológico socialmente reconhecido.  Existem, de um modo muito nítido, os pais biológicos, de todos  conhecidos, do mesmo modo que toda a gente, inclusive os pais  biológicos, reconhecem que os pais sociais têm mais direitos sobre as  crianças e estas mais deveres para com eles, na medida em que foram eles  que as criaram. Esta rede deriva do facto de muitos casais terem sido  levados a emigrar e a deixar os seus filhos e também do facto da terra,  do trabalho e da tecnologia se encontrarem repartidos de um modo  desigual e por isso, se poderem combinar as crianças em excesso com os  proprietários com terra disponível, mas sem filhos. Esta é a razão que  faz com que esta rede se transforme numa forma alternativa ao casamento,  no que diz respeito à reprodução social. O melhor exemplo disto pode-se  ver no sistema de distribuição dos padrinhos, embora esta não opere tão  estritamente na criação de paternidade social e apenas de maneira  limitada redistribua recursos. A  recriação dos laços sociais definidos  previamente pelo casamento é feita habitualmente por meio de grupos de  entreajuda em que os laços de parentesco são activados de acordo com a  capacidade pessoal e o conhecimento. A minha análise de entreajuda na  Galiza e em Portugal mostra que as relações de trabalho são construídas  ao longo das linhas de parentesco e os parentes são seleccionados para  permanecerem nessa rede social, de acordo com as capacidades  demonstradas em operarem num sistema de trocas recíprocas. A   paternidade é igualmente definida, visto que a selecção de um parente  como parente efectivo é seguida, muitas vezes, pelo parentesco ritual no  baptismo, confirmação, casamento ou nas adopções de facto. É  nesta perspectiva que se pode propor como hipótese que o casamento  representa um primeiro arranjo social, para se ter filhos, e que este é  seguido por um certo número de reajustamentos destinados a colocar as  pessoas através de uma redefinição de vínculos. O próprio casamento tem  um efeito de redefinição, visto que há todo um sistema de parentesco por  afinidade, que se desenvolve onde as pessoas forem socialmente  recolocadas nas suas mútuas relações.
          É mais difícil procurar  discernir as vias alternativas que existiram no passado, na medida em  que as pessoas morreram e os arquivos registam essencialmente as vias  estereotipadas da reprodução. A análise a que procedi de 245  nascimentos, situados entre os anos de 1862 e 1896, mostra que foram o  produto de relações matrimoniais, enquanto outros 37 provêm de mães  solteiras e pais incógnitos. O que importa ter em atenção é o facto de  todos os filhos ilegítimos provieram de assalariadas rurais –  jornaleiras – enquanto que não aparece registado um único caso de filhos  de proprietários com descendentes ilegítimos. Quando, por volta dos  começos do século XX, a professora primária da aldeia ficou grávida do  filho do grande proprietário local, da família do antigo morgado, aos  primeiros sinais visíveis, o oficial do Registo Civil foi chamado a sua  casa em Pinheiros, para celebrar o seu temporário casamento civil, que  logo se transformou em definitivo, uma vez cumpridas as necessárias  formalidades legais. A ilegitimidade como forma de reprodução humana tem  diminuído com o tempo, devido ao incremento da propriedade camponesa. A  observação realizada em Pinheiros demonstra que não houve qualquer  nascimento ilegítimo entre 1950 e 1980, se exceptuarmos os casos que se  encontram dissimulados pela atribuição da paternidade ao marido da mãe.  No que se refere aos filhos de 36 dos grupos domésticos da aldeia na  actualidade, verifica-se que só 5 das crianças nasceram oito meses após o  matrimónio, enquanto 12 o fizeram nos doze meses seguintes, 6 depois de  vinte e quatro meses e 3 num período que medeia entre trinta e seis e  sessenta meses após o casamento.
          No caso das cinco mulheres que  se sabe terem casado grávidas, todas eram filhas de pequenos  proprietários, enquanto os seus homens eram, na sua totalidade,  assalariados. Em Pinheiros, diz-se que a gravidez pré-nupcial é uma  maneira de forçar o casamento. Poderia afirmar-se que  é uma  das forças  do casamento, devido ao prestígio que se encontra associado à posição  de proprietário. Penso, contudo, a partir deste exemplo e de outros  dados de carácter geral, que tal leva ao casamento, sempre que não haja  qualquer impedimento, unicamente por causa da necessidade de manter uma  relação clara entre os recursos e aqueles que eles têm direito. O que  mostra que a noção de prestígio não é, por si só, explicativa, mas que  ela própria precisa de ser explicada.
          Com efeito, é possível fornecer  uma outra leitura dos dados, se tomarmos em consideração as necessidades  básicas de produção, que são prioritárias no sistema reprodutivo.  Aquilo de que um pequeno proprietário precisa é de uma força de trabalho  na qual não investe recursos que saiam do seu grupo doméstico. A sua  única possibilidade consiste em criar um grupo de trabalho que o ajude a  acumular e a poupar e tal apenas se dá se ele puder definir direitos e  deveres através de laços personalizados, ou seja, fazendo de uma mulher a  sua esposa, ou de um homem um marido, como sucede na maioria dos casos  em Pinheiros, de uma criança um filho, de um filho um herdeiro, de um  vizinho um compadre ou um sogro e de todos eles, uma força de trabalho.  No entanto, as coisas nem sequer se passaram assim. Durante o século  XIX, anteriormente, e mesmo durante a maior parte do século XX, nem  sequer existia terra possuída ou arrendada por camponeses, uma terra  onde pudessem utilizar, em seu benefício, a sua própria produção de  força de trabalho. Neste período, a produção de uma força de trabalho  camponesa era importante para aqueles cuja reprodução dependia do  trabalho camponês: os grandes proprietários fundiários. O facto de as  mulheres, no tempo em que eram jornaleiras sem terra, terem filhos serem  casadas e conferirem agora uma tal importância à gravidez, que esta  serve para levar ao matrimónio, mostra que há uma relação entre o ritual  e a angariação de recursos. O casamento define um certo número de  relações sociais: entre pessoas e recursos, entre pessoas, ou da pessoa  com outros a cuja capacidade de trabalho julga ter direito. É necessário  definir tudo isto, quando a propriedade é uma parte do sistema  reprodutivo, porque esta é uma relação social que liga as pessoas e  recursos materiais. Quando os recursos materiais pertencem a uns poucos e  a terra se concentra e o trabalho disperso, os camponeses sem terra não  só não detêm qualquer propriedade, como também não desejariam competir  numa base de igualdade jurídica, no que diz respeito aos direitos de  propriedade, com os grandes proprietários. A produção de produtores fora  do casamento deixa por definir o direito aos recursos e,  simultaneamente, deixa também em aberto todo um campo de mão-de-obra que  circula e cuja capacidade de trabalho fica disponível para os grandes  proprietários. A concentração da terra permite uma escolha entre os  muitos trabalhadores criados pela falta de terra e por um nascimento  despojado de direitos. As práticas reprodutivas sociais alternativas do  casamento revelam-se funcionais na organização do trabalho camponês,  sempre que este se encontra submetido a um grande proprietário. A  produção de produtores no exterior do matrimónio favorece a concentração  de propriedade e é, ao mesmo tempo, um resultado desta.
          A limitação das uniões livres  como forma de reprodução deve-se à extensão dos direitos de propriedade  entre os camponeses. As uniões livres criam uma força de trabalho sem  direitos sobre recursos, o que vem favorecer a concentração da  propriedade e esta, por sua vez, uma tal reprodução, ao assegurar um  mercado de trabalho aos camponeses. Os dados sobre a evolução do  casamento, que evoquei, mostram que quando estas condições mudam, por  razões sócio-económicas, o matrimónio ganha uma importância cada vez  maior em relação ás uniões livres e como corolário, dá-se a emergência  de novas formas alternativas de união, como a redefinição social da  paternidade e dos laços de parentesco em geral. O casamento existe ou  coexiste, com toda a certeza, com a sua ausência e é a isto que chamo  precisamente um sistema de formas socio-reprodutivas. Se confiro uma  ênfase maior à inexistência de casamento, tal deve-se ao facto de  procurar sublinhar a importância das uniões organizadas sem ritual  oficial na sua conjunção com aquelas que o são. E também porque quero  chamar a atenção para as correlações existentes entre ausência de  propriedade, união livre e nascimento ilegítimo e, inversamente, entre  propriedade, casamento, filiação legítima, bem como para o  desenvolvimento de outras formas de redistribuir descendentes. 3
          Não se pode esquecer que o  arrendamento e a enfiteuse eram duas das principais vias de trabalhar a  terra no passado. Ambas necessitavam, também, da criação de uma força de  trabalho que ajudasse a concentrar recursos. Deste modo, para os  rendeiros e para os enfiteutas, o casamento era uma forma de  racionalizar recursos, o que me permite dizer que as ideias religiosas  referentes ao acasalamento parecem ter sido postas em prática, de acordo  com a disponibilidade de recursos. Assim sendo, qual será a posição da  crença e do ritual em relação a esta organização das experiências  humanas? É sobre estes problemas que me debruço de seguida, tomando como  ponto de partida a ideia de que o ritual é uma outra dimensão religiosa  onde são expressas ideias e onde se pode ser claramente um ciclo – no  interior do qual o casamento existe – que acompanha toda a gente nas  áreas camponesas, através das suas vidas. Este ciclo ritual representa  uma outra dimensão das ideias religiosas sobre a reprodução, ideias nas  quais se encontra contido o aprendizado dos produtores.
 4. O casamento, um ritual de um ciclo de ritos destinados ao aprendizado dos produtores.
Existem dois conjuntos de factos  interrelacionados na produção de produtores: o sistema de práticas  reprodutivas que constitui a materialidade que inicia a produção de  produtores, por um lado, e as ideias da sua cultura ou a dimensão  abstraída da mesma materialidade, que lhes é ensinada através de um  ciclo de rituais ligados entre si. Como se pode ver em Pinheiros e em  Vilatuxe (Galiza), os seres humanos são introduzidos na sociedade pelo  baptismo, que funda ou publicita o facto dos esposos serem pais, sendo  aquela criança o seu filho e as outras pessoas padrinhos e parentes. É  então que se define, declara, publica e regista, desde o começo da  existência, de quem quer que seja na aldeia, todo um conjunto de  relações sociais. Este conjunto de relações pode muito bem servir de  base às manipulações e acertos que definem, mais tarde, o parentesco e a  paternidade. Tomando em consideração esta cadeia de rituais e a sua  função, podemos compreender o casamento e a sua capacidade enquanto  instituição que define relações sociais. A capacidade que uma  instituição possui para ligar um certo número de seres humanos a  despeito de existirem relações de tipo diferente entre eles, excluindo  muitos e aproximando outros, é possível unicamente num grupo social em  que é necessário definir pormenorizadamente os laços entre grandes  conjuntos. Esse grupo aceita os princípios envolvidos, quer porque criou  este modo de definir relações, quer porque com eles se encontra  familiarizado. Pode ser tomado como termo de comparação aquilo que eu  próprio observei no Vale Central do Chile (Iturra, 1971), onde os  habitantes dos latifúndios vivem juntos e têm filhos sem qualquer  formalidade, já que não há sacerdotes em número suficiente para cobrir  os extensos territórios das várias haciendas – mais tarde,  quando chega o missionário, casam-se de acordo com o ritual e baptizam  os seus filhos. Tanto o ritual tardio de uma relação matrimonial, como o  início de uma relação através do ritual, mostram que a religião é uma  parte da racionalidade do comportamento social, da acção social, ou  seja, do conhecimento. A religião é um corpo de comportamentos que está  presente na acção e que tem de se aprender.
          Como é sabido, a finalidade do  ritual consiste em publicitar que um novo estado foi atingido ou  adscrito a alguém, procurar a ajuda ou o apoio de outrém na nova  situação – e que quero deixar aqui vincado – constitui também o seu fim:  tirar ao indivíduo a capacidade de se retirar da nova situação, de  acordo com o seu capricho. No caso dos rituais do casamento, seja este  religioso ou civil, um homem e uma mulher declaram ser sua vontade o  viverem juntos para mutuamente se apoiarem e terem filhos. No caso do  matrimónio religioso, no momento em que declararam a sua decisão e tal é  referendado pela testemunha (o padre), as palavras do ritual  acrescentam que o que Deus uniu não pode o homem separar. Em ambos os  casos – civil e religioso –, a sua vontade é alienada, retirada do livre  arbítrio, passando para as mãos de outros seres humanos que actuam como  mandatários de agentes impressionantes: a divindade ou o Estado, Deus  ou a lei. É um ritual vinculativo que, como tal, se adequa à perfeição  dos objectivos da reprodução camponesa, já que a vontade divina ou a lei  são duas dimensões intangíveis, que não é possível manipular ou mesmo  compreender enquanto entidades. A dimensão global da divindade e da lei  é, aos olhos de um não iniciado, a de um mistério sacralizado, o que  significa que o é para toda a gente, com a excepção dos padres, juristas  e advogados ou dos agentes do Estado. A divindade é-lhe ensinada e  pregada como mistério durante toda a sua vida e há na lei uma presunção  cultural de equidade e de objectividade, como valores inamovíveis. Ambas  as ideias parecem ser aceites pelas pessoas em Pinheiros e os conteúdos  desta visão não parecem ser questionados pelos camponeses. Como  resultado do facto do casamento ser concebido como uma relação vinculada  não manipulável, afigura-se natural que lhe esteja ligada uma ideia de  eternidade. Pensa-se que o casamento une os esposos para o resto das  suas vidas e crê-se que ele se prolonga além da vida. No estudo que  levei a cabo de casamentos num período de cento e cinquenta anos em  Pinheiros e de duzentos em Vilatuxe, descobri um único caso de divórcio  em Pinheiros, motivado pelo adultério da mulher, quando o marido se  encontrava emigrado.
          Vejamos então, o que possibilita  esta concepção e faz com que os habitantes de Pinheiros, embora podendo  optar entre lei civil e a canónica, sempre escolheram o casamento  religioso para definir s suas alianças. Pode-se afirmar, por certo, que  uma mente formada no ritual e no mistério, acredita no conjunto de  ideias neles envolvidas e pode, aliás, criá-las. É necessário, contudo,  distinguir entre as razões da teologia e as razões das pessoas, apesar  de eu próprio não ser um conhecedor de teologia, vejo que há um certo  número de ideias relativas ao casamento, como as que prescrevem a  durabilidade do casal assim formado, a obediência das crianças e a  relação hierárquica criada ritualmente entre os membros do grupo  doméstico, que não lhe dizem unicamente respeito, antes pertencem à  lógica do campesinato e são cruciais para a organização das suas  relações sociais. É fácil constatar que a busca de uma ligação segura no  casamento é algo de básico para a reprodução do campesinato, devido à  natureza do trabalho camponês e à natureza dos elementos com que este  labora, como atrás assinalei.
          Em Portugal, esta procura  surge-nos, historicamente, com a maior das evidências. Até 1911, a lei  canónica era a lei oficial, que regulamentava a celebração do  matrimónio. Por sua vez, a lei civil tornou-se a única forma oficial  reguladora do casamento entre 1911 e 1940; depois da Concordata de  1944, estabeleceu-se a validade de ambas as leis, canónica e civil, na  criação do vínculo matrimonial. Entre 1911 e 1940, as pessoas de  Pinheiros casavam-se ao mesmo tempo de acordo com a lei civil e pela  Igreja. A partir de 1940 passaram a fazê-lo exclusivamente através desta  última. Os que, por vezes, procuram contrair matrimónio de acordo com a  lei civil, são, ou crentes relutantes – que, em muitos casos viriam a  casar mais tarde pela Igreja – ou, por outro lado, trata-se daqueles que  não estão muito certos quanto à sua vontade de casar e desejam uma  aliança temporária, por via da lei civil, já que alguns pensam que os  laços por esta criados têm apenas uma duração de três meses. (Isto  deve-se a uma confusão quanto ao tempo de validade da acta do casamento  civil, que fica sem efeito no caso dos esponsais não terem tido lugar  num período de três meses. Uma vez desfeita a confusão entre nulidade da  acta a anulação do casamento, vêm a casar pela Igreja. Este erro não se  deve a uma ignorância própria do ser camponês, como às vezes se pensa,  inclusive, na literatura antropológica. Esta ignorância resulta da  existência de um certo número de relações sociais, entre as quais a lei  civil, que não são criados pelos camponeses.)
          Esta preferência pelo casamento  religioso não pode ser explicada como habitualmente acontece, nem pela  fé das pessoas nem pela pressão das circunstâncias. A existência de uma  pressão social que, no meu ponto de vista, se exprime como uma ordem  moral adequada ao desenvolvimento das relações entre parentes, amigos e  vizinhos, não está aqui em causa. Ou então, pode-se aceitar que é a fé  que leva as pessoas a casar pela Igreja, desde que definamos a fé como  um conjunto de ideias que elas possuem acerca do funcionamento do mundo,  ou seja, um conjunto de ideias que permite manipular aquilo que não  parece materialmente atingível. Atente-se, por exemplo, que a procura de  cura para os males de que padecem no poço santo da paróquia, onde se  diz que apareceu S. Bartolomeu, representa um modo de pensar que não  requer explicações para as pessoas. Quando não há, na mente das pessoas,  uma conexão entre acção e resultado, é porque se trata de fé  (chamamo-lhe magia sempre que se trate de povos não europeus).
          Parece-me que há o mesmo tipo de  crenças a envolver o casamento. Ensina-se e pensa-se que Deus, através  do ritual, abençoa a união e irá providenciar para que não lhe faltem os  filhos e a prosperidade. Mas coloca-se, então, a questão: até que ponto  é que tudo isto, mais do que exprimir a crença de que as coisas se  passam realmente assim, não exprime aquilo que se pensa ser necessário  no casamento? Haverá alguma oposição entre a materialidade da acção e as  ideias destinadas a conduzir a acção? As pessoas sabem que sem trabalho  não há riqueza, para ter filhos é necessário copular e que a  prosperidade resulta da compreensão e harmonia existentes entre eles,  como se diz em Pinheiros. Será isto um modo de expressão ou uma busca de  protecção? Qual será a dimensão de pensamento pragmático existente nas  crenças das pessoas, que criam relações ritualizadas? O pensamento  religioso – e, logicamente a crença, o ritual – não será uma expressão  da racionalidade camponesa?
          Chamo racionalidade camponesa a  um  modo de explicar as coisas que, em certos momentos, aparece estar  separado daquilo a que chamamos objectividade, mas que, de uma maneira  ou de outra, confere direcção, ordem e significado às relações sociais.  Trata-se de um conhecimento que é criado através da experiência e  transmitido ao pensamento oficial, historicamente falando. As áreas de  população predominantemente camponesas são áreas iletradas e os textos  oficiais da crença não são manejados pelo povo. Mesmo quando os  camponeses sabem ler e escrever, não produzem conhecimento escrito ou  textos que pretendam organizar o seu modo de vida. A produção camponesa  de ideias faz-se através da tecnologia e da tradição ou em arquivos,  sendo também transmitidos por via oral. Por maior que seja a influência  mútua, entre esses textos e o comportamento das pessoas, pode dizer-se  que não há muita solidariedade entre ambos. É por isso que é possível  afirmar que a preferência pelo casamento pode ser o resultado de uma  combinação da racionalização da vida quotidiana por meio de ideias  religiosas, com práticas religiosas que são o corolário da importância  dessas mesmas ideias e com a necessidade de conferir durabilidade ao  matrimónio – a qual depende do facto do vínculo, uma vez criado, não  pode ser alterado e da total inserção das pessoas no ritual.
          A duração do matrimónio é um  facto que merece a nossa atenção. Se pensarmos que a produção camponesa  de ideias se faz através da tecnologia e da tradição oral, verificamos  que tal implica que a sua transmissão à geração seguinte requer um certo  tempo, indispensável ao aprendizado pela prática e à memorização. Uma  parte deste conhecimento é transmitida também no ritual, mas a aquisição  do saber necessário à reprodução do trabalho faz-se no interior do  grupo doméstico e da aldeia. Para efeitos de análise, podemos distinguir  três estádios diferentes no ciclo ritual, pelo qual se produz a  transmissão do conhecimento. O primeiro começa no baptismo e vai até à  confirmação. As crianças, nesta altura, frequentam a doutrina, que é o  conjunto básico de ideias que definem a condução das relações sociais,  já que, em meu entender, se trata principalmente de uma aprendizagem dos  valores do amor e do respeito para com a família e para com as  hierarquias e da solidariedade a ter com os vizinhos. Por outras  palavras, é um código de comportamento. O segundo estádio é aquele em  que as pessoas já se encontram familiarizadas com o sagrado e aprenderam  a aceitar um controlo externo das suas acções. Este estádio prolonga-se  até ao casamento e é materialmente o momento em que o grupo doméstico,  sob a direcção do pai, se apropria da capacidade de trabalho do  indivíduo. Em Pinheiros, durante quase um século, este período findava  entre as idades de 24 e 26 anos, que representa as idades no casamento,  no período compreendido entre 1862 e 1933. Mais recentemente, a idade no  casamento mais baixa para idades que podem chegar aos 13 anos (para  mulheres) e aos 20 (para homens). Este é, também, o tempo em que os  filhos se capacitam de que o controlo da propriedade da terra pelos pais  significa a negação da sua própria possibilidade de serem  proprietários. É o momento em que a apropriação da produção e os ganhos  são conseguidos pelo trabalho de todos, mas sob a direcção e organização  do pai. Neste sentido pode-se dizer que as ideias religiosas aprendidas  no primeiro estágio, postas em prática e repetidas ao longo das suas  vidas e instaladas por um meio de um certo número de acções no campo do  ritual (penitência, abstinência, Páscoa, procissões, esmolas, missas,  actividades das confrarias, etc.), não se limitam a facilitar alguns  aspectos da empresa familiar, mas são de todo em todo a sua  racionalidade. A confissão e a comunhão tornam-se um meio efectivo de  assegurar o cumprimento de certas regras do trabalho. Os laços pessoais  são a base da circulação de pessoas, de riqueza e de recursos, definidos  de um modo hierárquico em torno dos vínculos de parentesco, de sexo e  de idades. A racionalidade das actividades camponesas baseia-se num  código moral de compromissos e entreajuda que orienta as necessárias  alianças de pessoas, que se encontram em idêntica posição face aos meios  de produção. Todos possuem, de um modo desigual, recursos de que todos  precisam e não há outra relação efectiva, além da proporcionada pelo  código moral sistematizado na crença e que se aprende no ritual, que  permita conjugar a ajuda de outrém com os recursos próprios. Pode-se,  assim, afirmar que a maximização dos recursos escassos se faz através  destas ideias.
          Por fim, o terceiro estágio  inicia-se com o casamento. O grupo doméstico, quer como conceito, quer  como realidade, não desaparece depois dos filhos casarem. Todos os  grupos domésticos germinam e brotam, sempre que alguém parte e é fundada  uma nova casa consigo relacionada. Uma vez mais as necessidades em  trabalho manterão os membros unidos e esta relação mútua será expressa  em termos morais, como a assistência para com os pais, os deveres para  com os parentes, etc. A própria aldeia de Pinheiros é composta  unicamente por quatro «famílias diferentes», ou seja, quatro conjuntos  de grupos domésticos ligados entre si por diversos vínculos de  consanguinidade e afinidade, divididas por 68 casas (em Vilatuxe,  Galiza, há somente dois grupos de parentes dispersos em 14 aldeias).  Estes grupos, de acordo com o meu estudo de entreajuda, trocam trabalho e  recursos. Por certo de modo a obterem com isso algum ganho.
          É necessário, entretanto, para  se ver se aquilo que afirmo é pertinente, regressar à análise do tipo de  recursos e objectivos que regulam o casamento.
 5. O casamento, fase final de um processo de escolha, pelo qual são angariados e conjugados recursos humanos e materiais.
         O casamento representa, enquanto  reprodução, uma das muitas práticas por meio das quais se efectua a  produção material de produtores. Enquanto ritual, é o resultado das  ideias que as pessoas têm quanto à sua duração, bem como de um certo  número de regulações e crenças. Contudo, como se pode ver pela  observação directa e pela pesquisa dos arquivos, se examinarmos a  condição dos que casam e o contexto histórico em que se realizam os 229  matrimónios que estudei, podemos afirmar que regulações, crença e ritual  e a sua articulação com outras práticas reprodutivas se encontram, por  sua vez, em combinação com a necessidade material. Como tenho vindo a  argumentar, parece existir sempre uma lógica por detrás das ideias  acerca do casamento, da crença, do desejo ou mesmo do amor, lógica essa  cujo fim reside na angariação de recursos para a reprodução. Se  partirmos do princípio de que o casamento é apenas uma das práticas  reprodutivas – as quais variam no tempo e de acordo com o contexto em  que aparecem – e que ele é também um de entre uma série de rituais que  são na sua totalidade, a racionalidade da produção, então temos  elementos que nos permitem afirmar que o casamento constitui um campo de  comportamentos estratégicos. Esta constatação conduz-nos, entretanto, a  outras questões, como as de saber até que ponto é que o matrimónio  representa um campo aberto à manipulação por parte de seres humanos, ou  quais os aspectos mais avidamente discutidos e modificado pelas pessoas.  Estas questões são, obviamente, dirigidas ao casamento que tem lugar em  Pinheiros e, eventualmente, em Vilatuxe e no Valle Central do Chile, ou  seja, ao casamento camponês.
          Há um certo número de coisas que  podemos desde já deixar de lado. Em primeiro lugar, tem de se ter  presente que o património é quase imperativo e só não casa quem se pode  permitir fazê-lo. Tal, deve-se ao facto de ser nesta relação que a  produção dos produtores, enquanto herdeiros e indivíduos sujeitos à  autoridade paternal, tem lugar a quem quiser ter uma equipa de trabalho,  que lhe obedeça, terá de casar. Em segundo, o desenvolvimento da  propriedade privada acarreta uma importância crescente do casamento, já  que este é necessário para definir as relações interindividuais e as  pessoas com a terra e com outros recursos. Em terceiro, a monogamia é a  única forma oficial desta relação. Em quarto, a finalidade desta família  consagrada pelo sacramento é a reprodução e se existe impotência ou não  há descendentes, o matrimónio pode ser dissolvido pela lei canónica ou  civil. Por fim, esta relação social monogâmica, heterossexual e  destinada à procriação, é para toda a vida. Se estivesse unicamente em  discussão o casamento, poder-se-ia dizer que as manipulações podem ter  lugar em torno de todos estes aspectos, mas como o nosso tema é o casamento camponês,  verificamos que nenhum destes pontos pode ser submetido à manipulação,  pois tal significaria o fim deste tipo de racionalidade de produção.  Além disso, as limitações não provêm da instituição enquanto tal, mas  das condições em que esta existe e esta é a razão pela qual não é  possível estudar o casamento como se ele fosse uma categoria universal, e  subsumir a análise de todo o comportamento a este facto estabelecido.  Não há somente diferenças entre os casamentos tibetano e ocidental ou  entre kiriwina e o kwakiutl, há também diferenças no casamento  ocidental, que estão ligadas à racionalidade que opera na administração  dos recursos reprodutivos. É neste campo que posso constatar a  existência, nos dados de que disponho de, pelo menos, três níveis  diferentes de estratégias, que parecem ter-se modificado ao longo do  tempo de acordo com as mudanças no sistema de propriedade da terra.
          Há três níveis de manipulação  que permitem dizer que o casamento se destina a adquirir e conjugar  recursos. A lei canónica, primeiro, e mais tarde a lei civil, definiram  com muita clareza os graus de parentesco entre os quais o casamento era  possível ou em que, pelo contrário, este era interdito. Se o casamento  fosse uma instituição regulada exclusivamente pela lei, seria de esperar  que o comportamento dos esposos estivesse mais ou menos de acordo com  ela. De acordo com as minhas informações, 35 dos 229 casamentos que  ocorreram entre 1862 e 1962 (deixando de lado, por agora, o período que  vai desta última data até 1983) deram-se entre esposos abrangidos pelas  proibições. Com a excepção das ligações entre mãe e filho, pai e filha e  entre irmãos, todas as outras uniões são aceites (e mesmo estas, que  existem, são pelo menos localmente, socialmente aceites e os seus  rebentos classificados como filho-neto, filha-mãe, etc.). Os restantes  casamentos obedeceram à lei. Quais as razões destes dois tipos distintos  de comportamento face ao casamento? As dispensas são mais frequentes no  século XIX, momento em que a população da aldeia era composta  fundamentalmente por caseiros e jornaleiros. Com efeito, em finais do  século XVIII, em Pinheiros, a terra pertencia a um morgado, que  arrendava uma parte a cinco grupos domésticos diferentes, que se  encontravam relacionados por laços de parentesco. Era então habitual ver  o casamento unir primos ou, algumas vezes, tio e sobrinha ou ainda  ligar uma viúva e o filho do seu defunto marido. Há aqui, como na  Galiza, um conteúdo patrimonial no casamento, devido à dificuldade de  obter contratos de parceria num tempo em que o campo tinha de conter  todos os indivíduos necessários para o trabalho. Como pude verificar,  através dos elementos recolhidos nos arquivos e por meio da reconstrução  da aldeia a que procedi, existe simultaneamente, em cada uma das  quintas cultivadas em regime de parceria, um lento crescimento dos  grupos domésticos e das construções nelas existentes.
          Essa prática matrimonial  assegurava recursos em trabalho, por meio da coordenação entre a casa  dos pais e a casa do filho que ficava. No período compreendido entre  1862 e 1872, por exemplo, os 23 casamentos celebrados em Pinheiros  envolveram apenas cinco homens e duas mulheres vindos de fora da aldeia e  da freguesia, sendo uma destas a filha de um rico proprietário que  casou com o morgado. Os restantes eram trabalhadores assalariados e  artesãos que, ou viviam ou provinham de algumas das paróquias situadas  no espaço geográfico abrangido pela circulação de mercadorias, ou seja,  no espaço envolvido pelos percursos que conduziam da aldeia às feiras ou  da aldeia ao mosteiro local. Os restantes esposos destes dez anos  compreendiam 13 homens e 16 mulheres de Pinheiros e 5 homens e 4  mulheres da paróquia a que pertence a aldeia. Neste mesmo período, foram  concedidas pelos pais dos noivos seis dispensas por motivos de  menoridade e foram também obtidas do Papa seis dispensas que permitiram o  matrimónio entre parentes consanguíneos do 4º. Grau, os assim chamados,  primos direitos. Entre 1862 e 1900 a população de Pinheiros quase  duplicou. Embora a maioria dos esposos fosse constituída por  jornaleiros, começa a detectar-se, com uma certa frequência, o  aparecimento de indivíduos, pequenos detentores de terra, registados  como proprietários. Isto significa que a propriedade começa a mudar de  mãos e a dispersar-se entre a população. Dos 78 casamentos ocorridos  entre 1862 e 1902, 16 só puderam efectivar-se mediante licença dos pais,  por unirem menores e 14 tiveram de obter dispensa das proibições que  impendem sobre os parentes. Os casamentos entre habitantes da mesma  aldeia são, em absoluto predominantes e continua a ser baixo, apenas 12  homens e 3 mulheres, naturais de outras freguesias, o número de  matrimónios com indivíduos provenientes do exterior. Enquanto Pinheiros  permanece uma terra de jornaleiros e de rendeiros, permanece também a  necessidade de ultrapassar as proibições. Os jornaleiros poderão  aumentar a sua capacidade de trabalho, sendo primeiro dois a vender a  sua força de trabalho e depois mais, com o concurso dos filhos,  centralizando-se todos os rendimentos na casa paterna. (É claro que  também havia alguma terra nas encostas do rio Mondego cultivada  directamente pelos jornaleiros que trabalhavam as terras da família do  antigo morgado). Há, neste período, uma diferença nítida entre a  quantidade de terra possuída pela família do antigo morgado e a detida  pelos novos pequenos proprietários. Os esposos dos membros da primeira  eram sempre recrutados numa outra freguesia, provindo, aliás, da mesma  família, que possuía grande quantidade de terra.
 Os cônjuges dos pequenos proprietários  eram recrutados na aldeia, quer no grupo dos pequenos proprietários,  quer entre os jornaleiros. Vê-se que existe neste caso um esforço para  concentrar recursos e trabalho, já que, pela própria natureza do sistema  de propriedade, o trabalho era obrigado a dispersar-se.
          Assim sucedia, na verdade.  Através do censo que efectivei, podemos verificar de que forma se opera a  mudança na orientação do casamento, quando a população iniciou a  emigração para o Brasil, para a Argentina e para a Venezuela. Até ao  momento, verificámos que existiam no matrimónio dois níveis de  manipulação, com a mesma finalidade: obter recursos, ultrapassando,  pelas licenças, os obstáculos ao casamento representados pela menoridade  e pelo parentesco, e incrementar os recursos existentes, através da  concentração do casamento num grupo de pessoas que estão mais ou menos  na mesma posição face aos meios de produção (o mesmo, aliás, sucede em  Vilatuxe). As estratégias visam principalmente lidar com a lei,  procurando obter as licenças que possibilitem a concentração de  recursos. Consequentemente, é possível afirmar que o casamento camponês é  orientado pelos camponeses, mais do que pela Igreja, mas também que é a  Igreja quem estabelece o contexto em que se inserem as licenças. A  partir de 1902 este quadro começa a mudar. É possível adquirir mais  terra e aprece que, neste momento, os grupos domésticos começam a  divisar uma estratégia diferente. Tinha de se pagar a aquisição de  propriedade e esta, ao mesmo tempo que, pela natureza dos direitos que a  definem, concentra a força de trabalho num mesmo território, leva  também os homens à emigração, já que o cultivo das pequenas parcelas não  gera os meios suficientes para o seu pagamento. Com a emigração  masculina o sistema de reprodução humana corre riscos e começa a ter  lugar, então, o casamento com homens naturais de outras freguesias. As  mulheres tornam-se herdeiras da terra no mesmo momento em que os homens  se transformam em seus compradores. Por volta dos anos quarenta e  cinquenta do século XX constata-se um número crescente de indivíduos de  fora da aldeia ou da freguesia que casa com as mulheres de Pinheiros, e  assiste-se a uma quebra nos pedidos de dispensa e aumenta o número de  pequenos proprietários. A partir de 1950 é possível detectar um rápido  desenvolvimento na construção de casas na aldeia, uma queda no número de  filhos por casal e mais tarde, o emergir de novo de uma tendência para  casar no interior da aldeia. Entre 1962 e 1983 a maioria dos casamentos  unia homens naturais de Pinheiros e proprietários agrícolas. Esta rápida  e condensada incursão na história de Pinheiros mostra claramente,  segundo espero, que o casamento – que se superiorizou sobre as outras  formas de reprodução à medida que a propriedade se difundiu entre todas  as casas – é um campo aberto à manipulação. Poderia aqui, argumentar  mais desenvolvimento sobre a importância crucial de que se reveste a  escolha do esposo, quando se procura cumprir o objectivo final da  relação matrimonial, a angariação de recursos. Mas, o que pretendo, por  agora, é assinalar os vários elementos que permitem ver no casamento o  resultado de uma escolha, cujo conteúdo reside nas condições  socio-económicas que possibilitam obter terra. Embora este seja pensado  como uma relação sagrada resultante do amor entre indivíduos, é possível  observarmos que nela existem um certo número de constrangimentos  estruturais, que apontam em cada momento aos camponeses a direcção da  melhor aliança. Há sempre lugar para elaborar estratégias de  reprodução,  num campo que vai do casamento entre primos ao casamento  intercontinental. Este modo de ver apresenta o casamento como um campo  aberto a manipulações, limitadas por determinadas barreiras, aquelas que  derivam da natureza do trabalho camponês e do seu processo reprodutivo.  Estas manipulações definem, em última instância, os conteúdos do ritual  e a importância de uma ou de outra forma de reprodução utilizada de  acordo com uma racionalidade expressa em ideias religiosas, com a qual  se organiza a produção, mas na qual tem também lugar a racionalidade do  lucro. Sobre este tema, debruçar-me-ei nas páginas que se seguem.
 6. O casamento enquanto instituição redistributiva regulada pelo lucro.
            Referi-me até agora ao  casamento enquanto relação, enquanto instituição e ligação material que  gera produtores. Procurei, de igual modo, observar o casamento como um  ritual, ou seja, como ideias que publicitam a relação entre pessoas e  destas com recursos materiais e assinalei a relação também existente  entre o desenvolvimento do casamento e o da propriedade. Há muitos  factos que justificam a afirmação de que o casamento surge como um meio  para definir relações e é também ele próprio uma relação económica. Há a  já mencionada entre a terra e o matrimónio, ou seja, o desenvolvimento  articulado da propriedade e do casamento. Neste caso, as relações  económicas aparecem no interior de uma relação social, onde os direitos e  os deveres entre os esposos e entre os pais e os filhos definem  relações de trabalho. Deste modo, tanto em Pinheiros, como em Vilatuxe, a  circulação de riquezas e a transmissão de propriedade à geração  seguinte processa-se através das linhas paterna e materna. Embora a  terra e outras riquezas materiais não sejam aqui mercadoria, na medida  em que é devido à qualidade da ligação entre pessoas que a riqueza  circula, estas mesmas riquezas transformam-se em mercadoria a partir do  momento em que são usadas na produção de bens para o mercado e se tornam  num valor económico. O casamento é a relação social onde é definida a  economia do campesinato, quer através da regulação das relações de  trabalho, quer criando uma mercadoria e gerando produtores. A  propriedade é uma outra relação económica, embebida no social, que serve  como ligação entre os esposos e os seus filhos, que permite um certo  número de outras relações, tais como as relações de troca com parentes e  vizinhos e é uma condição básica para a participação dos produtores no  mercado. Deste ponto de vista, é possível constatar que as relações  entre os esposos e entre estes e os filhos, bem como a sua relação com  os outros através da propriedade, têm um duplo valor. Por um lado, são  definidas pela racionalidade camponesa, que se baseia em ideias  religiosas: o casamento é um ritual, a propriedade é privada, as  relações de troca fundam-se num dever moral, de amor e caridade. Ao  mesmo tempo um grupo doméstico é um grupo de trabalho que vende no  mercado e ganha dinheiro nesta troca, que é a razão da viabilidade da  sua união, a propriedade é uma base material para a produção de bens, a  troca proporciona um suplemento de trabalhadores, que não podem ser  obtidos por via do salário e que são deste modo angariados por laços de  parentesco e de ritual e o trabalho dos grupos assim organizados produz  uma mercadoria que circula e cujo ganho reverte para o  proprietário.            A estratégia dos grupos para obter terra  baseia-se numa relação matrimonial, que possibilita uma divisão do  trabalho entre os membros do grupo doméstico. Como vimos, em Pinheiros  as mulheres ficam, os seus irmãos emigram e os homens vêm do exterior  casar com as mulheres. Trata-se assim, de um empreendimento em que os  pais dotam uma filha que com essa propriedade obterá um marido. Ambos  estes terão as crianças necessárias para renovar o grupo doméstico e  começar um novo ciclo. Os irmãos, entretanto, adquirirão o dinheiro com o  qual poderão comprar mais terra para si próprios e tal ajudará os  grupos domésticos que com eles são aparentados, na medida em que  consolidam uma base comum de recursos. Os maridos recém-casados entre  1940 e 1970 eram, na sua maioria, camponeses sem terra, que eram  artesãos ou exerciam uma profissão. Foi esta combinação de performance  económica que permitiu o desenvolvimento da propriedade camponesa em  Pinheiros (do mesmo modo que em Vilatuxe). A este respeito é importante  ter em consideração a condição económica dos esposos que vieram casar e a  daqueles que eram naturais de Pinheiros. Parece que a condição  necessária para os homens serem então aceites era, ou não terem alguns  propriedade, ou, no caso de a possuírem, não estarem envolvidos com o  trabalho nessa terra. Por assim dizer, a condição era estar disponível  para aplicar a sua capacidade de trabalho à terra que o esposos de  Pinheiros oferecesse.            A produção de crianças é uma parte  importante do papel económico do casamento. Quando a população se  compunha principalmente de camponeses sem terra, os trabalhadores eram  produzidos tanto pelo casamento, como por outras vias, o que também dá  um conteúdo económico a qualquer relação, visto que tal afecta o mundo  produtivo. 4 O casamento de jornaleiros possuía ainda uma vantagem extra  na esfera económica, já que o pai tinha o poder, sancionado pela lei,  pela religião e pelo costume, de se apropriar não só da capacidade de  trabalho do seu filho, nora e netos, mas também do dinheiro que estes  ganhavam, enquanto estivessem sob o mesmo tecto. Assim, quer quando a  terra se encontrava concentrada nas mãos do fidalgo, quer quando esta se  encontra dispersa na posse dos camponeses, o casamento tem sido o  centro de relações económicas definidas pelos laços sociais criados pelo  ritual.            É possível defender, por várias razões que, se o  casamento possui este conteúdo económico, ele se encontra então  submetido às condições de troca. Há argumentos que podem ser aduzidos  para justificar esta afirmação. Veja-se, por exemplo, o que há pouco  denominei de casamento dos jornaleiros. Um jornaleiro existe desde que  haja também alguém que possua a terra, porque enquanto o grande  proprietário realizar um lucro através da acumulação de riquezas   produzidas pelos camponeses, e este proprietário manter-se-á, como  sucedeu historicamente. Como atrás mencionei, as práticas reprodutivas  nesse tempo revestiam-se de uma grande variedade, bem como havia uma  concentração de casamentos entre pessoas da mesma condição. 5 O número  de nascimentos era elevado devido ao facto de os que sobreviviam  representarem uma boa mercadoria na troca de trabalho (por dinheiro ou  alimentos; não me refiro a ajuda neste tempo histórico). O facto dos  filhos serem um meio de troca por salários, por terra, através do  casamento ou uma força de trabalho utilizável no arrendamento de terra,  parece ser uma das razões de uma idade tardia no casamento. 6 Os filhos  eram retidos em casa para o trabalho, até que os mais novos estivessem  em condições de os substituir e eles pudessem ser dispensados (em  Vilatuxe, no tempo em que vigorava o foro, ou seja, por volta de 1930,  era o filho mais velho quem ficava. Em Pinheiros é uma filha). Em todas  estas vias o lucro dos grandes proprietários intervém no casamento  camponês, bem como na sua inexistência, mas esse é um outro caso, que  deixo de parte, centrando as minhas análises, por agora, no matrimónio.  Quando os camponeses são catapultados para a propriedade privada pelas  condições específicas da troca geral e têm de delinear um certo número  de estratégias para controlarem a terra – e se o não conseguissem, não  poderia haver reprodução em Vilatuxe e em Pinheiros, na medida em que os  grandes proprietários, pura e simplesmente, não puderam continuar a  assegurar a manutenção das condições em que tinha lugar a produção e  desapareceram – aparece outrém em cena a lucrar. Os lugar a produção e  desapareceram – aparece outrém em cena a lucrar. Os arquivos e o censo  que fiz mostram uma queda na idade do casamento, uma emigração massiva  que separa os esposos, uma diminuição do número de filhos por casal e um  incremento, na actualidade, do número de pessoas que casam. Os  camponeses tratam agora com condições monetárias e têm na mão a sua  própria organização de reprodução.            Por aqui me fico, neste  artigo, já que este é o tipo mais conhecido de racionalidade camponesa,  aquele que eu mesmo tenho tratado com um maior detalhe. O que gostaria  de assinalar, entretanto, é que, quando afirmo que o casamento é  regulado pelo lucro, quero mencionar, quer o lucro do grande  proprietário, quer o das cooperativas e das multinacionais (os novos  realizadores do lucro, como atrás referi), quer mesmo o dos intermédios.  Os camponeses não fazem um lucro que seja uma remuneração do capital e o  capital significa uma apropriação do possuidor de capital. O capital  não se desenvolve nas áreas camponesas. As áreas camponesas desenvolvem o  capital, na medida em que a indústria baseia a sua reprodução numa  produção camponesa barata. Esta é, precisamente, a razão pela qual os  camponeses precisam de guardar uma racionalidade em que o casamento e o  ritual têm um lugar central, como vias de organização da reprodução  social. O lucro é, também, uma componente, por defeito, desta mesma  racionalidade.
 7. Observações finais
Tenho vindo a estudar o tema da  racionalidade camponesa no Chile (1966-1968 e 1971-1973), na Galiza  (1974-1978) e em Portugal (desde 1983), tendo sido através da minha  documentação galega que compreendi que o casamento, pelo mesmo no caso  das áreas camponesas, tem um lugar central na racionalidade das relações  económicas. Contudo, quer porque outro tipo de relações sociais me  interessava sobremaneira, quer por me encontrar culturalmente –  etnocentricamente – imune, não fui capaz de ver o casamento com o olhar  com que discuti aqui. Com efeito, estudar o casamento é estudá-lo como  instituição central de qualquer cultura, à qual se encontram ligados  todo o tipo de opiniões, definições e efeitos sobrepostos e  estereotipados. O casamento é habitualmente visto não só como um assunto  muito sério, mas como um rito sagrado, abençoado pela doutrina, pública  ou privada (concubinato). Embora ainda não lide com conceitos como  desejo, emoções, amor e sexo, todos eles parecem ser as razões que, em  comum e no discurso analítico, são atribuídas à realização do casamento.  Pensa-se, assim, que é o mundo das emoções que conduz à escolha dos  esposos, à sua vida em comum e à criação dos filhos. Como membro da  minha cultura também acreditava que as coisas se passavam assim. Mas  quando, como antropólogo, comecei a analisar as alternativas à  instituição tão largamente difundidas, quer inter, quer intra  culturalmente, falando  os seus elementos cimentados e as suas funções e  relações; quando fui confrontado no trabalho de campo com uma situação  em que os humanos estão submetidos a constrangimentos na sua relação com  os meios e vi o rigor com que pensavam nisso, então compreendi que as  pessoas tinham de reflectir com muito cuidado na sua reprodução. 7 Como  corolário lógico, a necessidade de uma orientação clara faz-se sentir,  ao mesmo tempo, na alocação de recursos, na circulação de pessoas e nos  sentimentos. Todos estes domínios são vistos em conjunto, não só pelas  famílias e pelos esposos a quem tal diz respeito de modo imediato, mas  por qualquer membro de um grupo social determinado. Estas são as minhas  conclusões, extraídas da fala dos camponeses e  dos  testemunhos dos  arquivos. Tudo se passa como se a mente, que cria as relações  sociais, estivesse a esfriar toda e qualquer condição histórica e todas  as qualidades das pessoas, para formular ideias que, através do ritual,  orientam e delineiam a sociedade – pelo menos a parte da sociedade que  se encontra ligada aos outros pelo lucro. Pode-se, então perguntar, como  Flandrin (1975): «et l’amour existe-t-il?». A busca da uma qualquer  resposta deve passar, como dizem Medick e Sabean (1984), por uma análise  atenta do imbricar dos interesses e das emoções.
 BIBLIOGRAFIA
 ALMEIDA, João Ferreira de, (1984), 1986: Classes Sociais nos Campos: camponeses parciais numa região do noroeste, Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Lisboa, Lisboa.
 BLOCH, Maurice, 1973: “The Long Term and the Short Term – The Economics and Political Significance of the Morality of Kinship”, in Goody, Jack (ed.), The Character of Kinship, Cambridge University Press.
 BOUQUET, Mary, 1984: “The Differential Integration of the Rural Family”, in Sociologia Ruralis, vol. XXIV, nº 1, Assen-Van Gorcum.
 BOURDIEU, Pierre, 1976:”Marriage Strategies as Strategies of Social Reproduction”, in Foster and Ranum (eds.), Family and Society, The John Hopkins University Press, London.Código de Direito Canónico, (1917) 1983 – Conferência Episcopal Portuguesa, Lisboa.Código Civil, (1867)1966, 1978, 1995 e 1999 – Porto Editora.
 FORTES, Meyer, 1958, “Introduction”, in J. Goody (ed.), The Developmental Cycle of Domestic Groups, Cambridge, Cambridge University Press.
 GODELIER, Maurice, 1975: “Mode of Production, Kinship and Demographic Structures”, in M. Bloch (ed.), Marxist Analyses in Social Anthropology, A S. A Studies, London.     1979: “Infra-structures, societés, histoire”, in Dialectiques,  nº. 21, Paris.     1982: “La Production des Grands Hommes”, Fayard,  Paris.     1984: “L’Idéal et le matériel. Pensée, economies, societés”,  Fayard, Paris.
 GOODY, Jack, 1958: “The Fission of Domestic Groups Among the Lo Dagaba”, in Goody (ed.), The Developmental Cycle of Domestic Groups,  Cambridge University Press.     1976: “Production and Reproduction, a  Comparative Study of the Domestic Domain”, Cambridge University Press,  Cambridge.     1983: “The Development of the Family and Marriage in  Europe”, Cambridge University Press, Cambridge.
 HARRIS, Olivia e YOUNG, Kate, 1981: “Engendered Structures: some problem in the analyses of reproduction” in J. Kahn and J. Llobera (eds.), The Anthropology of Pre-capitalist Societies.HOLLIS, Martin, 1967: “Reason and Ritual”, in Philosophy, XVIII.     1975: “Rational Economic Man”, C. U. P, Cambridge.
 HOUTART, François, 1980: “Religion et mode de production pre-capitalists”, Éditions de l’Université de Bruxelles.
 ITURRA, Raúl, 1971: “Notas para un  estudio de movilización Campesina”, ed. Centro de Estudio Agrario y  Campesino, Universidad Catolica do Chile.     1977: “Strategies of  Social Recruitment: a Case Mutual in Rural Galicia”, in M. Stuchil (ed.), Goals end Behaviour, The Queen’s University Papers in Social Antroplogy, vol.II.     (1979) 1988: Antropologia Económica de la Galicia Rural , Ed. Xunta de Galicia, Compostela.     1991: “Continuity and Change: the Peasant way to transition”, in Maurice Godelier (ed.)Transitions et subordinations au capitalisme, C.U.P./M.S.H., Cambridge-Paris.
 ITURRA, Raúl e José Manuel SOBRAL, 1984: “A Domesticação do Pensamento Selvagem dos Europeus”, in Ler História, nº 3, Lisboa.
 MARX, Karl, 1844(1977): “Economic and Philosophical Manuscripts”, in McLellan (ed.), Karl Marx: “Selected writings”, Oxford University Press.
 MEDICK, Hans e SABEAN, David, 1984: Interests and Emotions, Cambridge University Press.
 MEILLASOUX, Claude, 1972: “The Social Organization of the Peasantry: the Economic Basis of Kinship”, in The Journal of Peasant Studies, vol. XI.NASH, Manning, 1981: “The Social Context of Economic Choice in a Small Society”, in Man, LXI.
 O’NEILL, Brian Juan, 1984: Proprietários, Lavradores e Jornaleiras, Desigualdade Social numa Aldeia Transmontana, 1870-1978, Publicações Dom Quixote, Lisboa.
 ROWLAND, Robert, 1984: “Sistemas Familiares e Padrões Demográficos em Portugal”, in Ler História, nº. 3, Lisboa.
 WOLF, Eric, 1968: “Kinship, Friendship, and Patron-Client Relations”, in The Social Anthropology of Complex Societies, Tavistock, London.
 Fontes e publicações oficiais:
 Registo Paroquial, 1661-1862 – Livros de Baptismos e Casamentos.
 Registo Paroquial, 1862-1911 – Livros de Baptismos, Casamentos e Óbitos.
 Registo Civil, 1911-1983: Livros de Baptismos, Casamentos e Óbitos.
 Arquivo Distrital, 1661-1868: Livros de Baptismos, Casamentos e Óbitos.
 Arquivo Paroquial, 1911-1938 – Róis dos Confessados e Status Animarum.
 * Publicado em Ler História, n.º 5, 1985. (Versão abreviada do original em inglês, publicado em Social Compass, vol. XXXIII, Louvain-la Neuve.)
 1 – Inspirei-me nas ideias de diversos  autores, nas minhas afirmações sobre a religião e o ritual enquanto  racionalidade da produção e da reprodução. Quero citar, entre outros,  Karl Marx (1884): “Se conheço a religião como uma autoconsciência  humana exteriorizada, então o que conheço nela enquanto religião não é a  minha própria consciência, mas a confirmação nela da minha própria  consciência exteriorizada”, pág.106 (1977). Também Manning Nash (1961), ao estudar os membros do grupo étnico Amatenango, Panamá e Sul do México, diz  os Amatenangueros são actores económicos «racionais», na medida em que  conjugam meios e fins, só que os seus valores são outros (ou se  adicionam a) e não maximização de uma única dada  grandeza”, pág.318 (1968). Martin Hollis (1967) diz da etnia da Serra Leoa: “Alguns  Yorubas primitivos trazem consigo caixas cobertas com conchas, que  tratam com uma atenção especial. Quando lhes perguntam o que andam a  fazer com elas, respondem, aparentemente, que as caixas são as suas  cabeças e as suas almas e que andam a protegê-las da acção da  feitiçaria. Isto será um facto interessante ou uma má tradução?.” (1977, pág. 221). Martin Hollis (1975, pág. 245): “É  estranho que as necessidades envolvidas na produção e na reprodução não  sejam mais latamente reconhecidas, visto que se encontram profundamente  embebidas na nossa linguagem”. Maurice Godelier, na base dos seus estudos dos Baruya da Nova Guinée, acrescenta (1984): “As  ideias conduzem o mundo, porque moldam na origem as realidades sociais e  empurram num certo sentido as sociedades e a sua história durante  milénios. Uma sociedade não se reduz às ideias que os seus membros podem  conceber acerca dela. Existem realidades no exterior do pensamento que  têm o mesmo peso que este na História, na primeira fila das quais se  encontram as realidades materiais e as relações sociais que as  organizam”. François Houtart (1980, pág. 5): “[...] a  particularidade do nosso interesse, a saber: a análise das funções  sociais da religião nos diferentes tipos de sociedade que precedem o  desenvolvimento do capitalismo”.
 2 A este respeito argumentaram especificamente Wolf (1968), Bourdieu (1976), Bloch (1973), Iturra (1981).
 3 – Trabalhei em torno desta correlação num outro estudo (Iturra, 1979). Para um estudo detalhado do tópico, v. O’Neill (1984).
 4. Como fazem também em Vilatuxe e no  Valle Central do Chile, excepto quando se revoltam. Mas, quer se trate  das rebeliões camponesas dos anos cinquenta e setenta no Chile ou das  lutas, com a formação de sindicatos, dos foreros da Galiza no  começo deste século, o conteúdo consistiu sempre na redefinição da lei e  dos direitos de propriedade em seu benefício. A forma da lei  posta em questão e as ideias religiosas jamais foram atacadas. A disputa  teve como objectivo definir quem iria gozar de direitos patrimoniais e  controlar a circulação dos produtos. 5 – Estou a evitar conscientemente o  conceito de classes, porque, para o aplicar necessito de aprofundar o  conhecimento sobre os dados de que disponho. O meu trabalho de campo em  Portugal continua. Para uma discussão clara da utilização do conceito no  estudo de áreas rurais, v. Ferreira de Almeida (1984)
 6 – Rowland (1984) estima que a idade das mulheres no casamento era, em 1978, na área em que se situa Pinheiros, de 25-26 anos.
 7 -A necessidade que as pessoas sentem de  elaborar estratégias na sua reprodução é também demonstrada pela sua  manipulação das regras da Igreja, como atrás sublinhei. Como eu e Sobral  referimos (Iturra e Sobral, 1984), tem sido mostrado, por muitos  historiadores, que o casamento era controlado por pais e parentes ao  ponto de estes entrarem em confronto aberto com a Igreja em diversos  momentos.
In: avatar 

Nenhum comentário:
Postar um comentário